quinta-feira, 15 de outubro de 2009

ILHA DAS FLORES


Meu nome é Joana. Tenho 29 anos e três filhos para criar sozinha. O pai sumiu, vai saber por onde anda. Moro na Ilha das Flores. O nome é bonito, mas não se engane. Aqui não é o paraíso. Eu não sei ler nem escrever. Mas já não me preocupo muito comigo. Penso mais no futuro dos meus filhos. Às vezes acho que Deus nos esqueceu. Mas depois a fé de dias melhores volta em meu coração. Temos que garantir nossa comida. Sim, porque têm outras pessoas como nós disputando a mesma comida todos os dias. Onde vamos pode-se chamar de feira. Mas não é aquela feira bonita cheia de frutas e verduras frescas. Ah, se um dia eu pudesse ir numa feira dessas... mas é só um sonho. A feira que vamos fica numa fazenda e temos que correr para pegar melhor lugar na fila, porque muitas outras pessoas como eu disputam essa “feira”. Você quer conhecer? Então me acompanhe. Meus filhos vão junto para me ajudar. Toda vez que chegamos lá ficamos ansiosos esperando o portãozinho abrir. Os caminhões que trazem a comida vêm de muitos lugares. Chegamos... Hoje somos os primeiros! Olhe, o caminhão de comida chegou. Já podemos sentir o cheiro. Não, não é o aroma agradável de frutas frescas. Pode acreditar, você está sentindo cheiro de comida podre. Olha lá, o caminhão descarregando tudo. Não é nossa vez ainda. Primeiro são os porcos. Temos que esperar eles se empanturrarem e só depois os empregados do fazendeiro abrem o portãozinho pra gente. Pronto, agora é nossa vez. Cada família tem 5 minutos para pegarem os restos. Vamos, crianças, somos nós agora. Em meio à lavagem procuramos algo que ainda pode ser comido. Ah, já nos acostumamos com a podridão. Afinal, isso é o que nos resta para sobrevivermos... Se tenho um grande sonho? Sim, claro! Quero que meus filhos tenham a oportunidade de terem uma vida digna e feliz, para que não ofereçam restos de porcos para os meus netos.

* Em Porto Alegre, encontra-se Ilha das Flores, onde pessoas como você alimentam-se da lavagem dos porcos em decomposição, enquanto você reclama da mistura que sua mãe fez para o almoço...

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